Por Alessandro Vianna
Procrastinar é algo de que pouco se fala, mas que muito se faz.
Embora “embromação” e “enrolação” possam ser quase sinônimos populares, a procrastinação vai um pouco além disso. É um comportamento crônico nocivo, embora muito comum.
É aquele hábito de deixar tudo para depois: uma tarefa “chata”, os estudos, o regime alimentar, as práticas físicas, o abandono de um vício, passar a economizar – coisas que sabemos que precisamos fazer, mas que, por inúmeras razões, ficamos adiando; muitas vezes nos enganando com desculpas frágeis e, não raro, falsas.
O procrastinador é alguém que faz várias coisas ao mesmo tempo, exatamente para não fazer aquilo que realmente deve ser feito. Quando pensa no que de fato tem de fazer, sente-se preso e sem reação.
As consequências, não raro, são danosas, especialmente a longo prazo, quando, olhando pra trás, se percebe quanto tempo foi jogado fora por falta de ação objetiva.
Ao deixar de cumprir certas obrigações, podemos decepcionar alguém, perdendo credibilidade e oportunidades. Isso se percebe claramente na vida conjugal, no convívio familiar e na carreira profissional. Depois ficamos observando a trajetória vitoriosa de outras pessoas, que entraram em forma, ganharam conhecimentos e avançaram profissionalmente.
Quando vejo pessoas querendo empreender grandes mudanças de imediato, sei que estou diante de um procrastinador, porque ele fica inativo por muito tempo e, depois que percebe nos outros o quanto ele próprio não evoluiu, resolve mudar tudo de uma vez.
É óbvio que não vai conseguir, porque as nossas grandes realizações são conquistadas aos poucos. Desse modo, novamente derrotada, essa pessoa tende a desanimar e voltar a procrastinar novamente, repetindo um ciclo fadado à infelicidade.
Enquanto procrastina, a pessoa vai absorvendo estresse por uma oculta sensação de culpa, sentindo a sua perda de produtividade e cultivando vergonha em relação aos demais, por não conseguir cumprir seus compromissos.
A formação de um “enrolador” muitas vezes começa na infância. Crianças podem tornar-se procrastinadoras no futuro, por conta do tratamento que recebem dos adultos. Daí a conveniência de revermos constantemente as nossas crenças, para nos livrarmos de influências negativas que adquirimos ao longo da vida.
Crianças futuras procrastinadoras: duas das razões mais clássicas são:
- A criança extremamente protegida, condicionada a achar que sempre alguém fará por ela. Quando adulta, ela tenderá, inconscientemente, a sentir-se insegura para agir, por não ter alguém a auxiliando.
- A criança que é exageradamente cobrada pode desenvolver a característica do perfeccionismo. Assim, ela tende à procrastinação por acreditar que, mesmo se dedicando, não conseguirá realizar as coisas de modo primoroso – e acaba postergando tudo o que acha importante.
Tratamento
A procrastinação crônica é quase sempre associada a alguma disfunção psicológica ou fisiológica. Portanto, é passível de tratamento.
Quando recebo pacientes procrastinadores, incluo no tratamento algumas recomendações que ajudam muito a livrá-los dessa anomalia. Eis algumas:
- Reconheça, quando está enrolando, que pode haver mais dor em procrastinar do que em realizar a tarefa. Muita coisa é menos complicada do que parece ser.
- Não deixe aquele afazer chato por último, para que ele não se torne urgente e o apavore ainda mais.
- Experimente a sensação de alívio e o fortalecimento da autoestima após concluir uma tarefa e perceba que livrou-se dela de maneira positiva, enfrentando-a.
- Para encorajar-se, pense no que vai deixar de ganhar ou no que pode perder caso não realize essa atividade. Se puder escrevê-las e avaliá-las seriamente, melhor.
- Se a tarefa for muito trabalhosa, divida-a em partes e vá realizando uma a uma, com um pequeno intervalo entre elas, e comemorando (sim!) a última concluída.
- Abra-se para o novo, deixando de agarrar-se às velhas experiências e crenças. O passado não volta mais; o presente é continuamente feito de novos desafios e o futuro é construído passo a passo pelas ações do presente.
- Quando perceber que está querendo procrastinar de novo, proponha-se a atuar por apenas alguns minutos na ação que está tentando evitar. Pode ser que você perceba que não é tão desagradável quanto pensava e venha a vencê-la.
- Caso lhe seja por demais desagradável, dê-se uma pausa e passe a fazer algo útil (sem parar de agir), mas determine quando voltará ao assunto pendente.
Vencer a procrastinação trata-se de uma vitória para a vida inteira, como a daquela criança que um dia perde o medo do escuro.