Walcyr Carrasco
Quando eu era menino e vivia no interior, era comum a figura da tia.
Solteirona, amadurecia na casa dos pais, sem filhos, só com sobrinhos.
Era a eterna tia. Em geral, nem sequer tinha profissão.
Ajeitava-se com trabalhos de costura, bordados, salgadinhos para festas, bolos de aniversário e balas de coco embrulhadas em papel de seda, fazendo cascata.
Convidada para todas as festas dos parentes, acabava na cozinha, dando uma ajuda. Sempre tinha uma história de amor no passado: um noivado longo que acabou alguns meses antes do casamento; alguém que morreu; um “safado” que queria fazer “bobagem” e desistiu porque “ela era séria”. Quantas vezes ouvi esses relatos na família!
Lembro-me de uma prima de segundo grau que só encontrava o namorado, do Paraná, em Dia de Finados, quando ele vinha ver o túmulo da mãe.
Marcavam encontro no cemitério. No quarto, minha mãe avisou:
— Eu acho que esse rapaz é casado! Se não, porque não dá o endereço?
Minha prima não foi e nunca mais viu o moço. Nem arrumou novo pretendente. Muitas famílias torciam para ter uma solteirona disposta a cuidar dos pais. Tinha a missão de viver com eles, ajudar na velhice. Quando os dois morriam, tornava-se um trambolho.
Os irmãos alegavam que não havia espaço para ela, que acabava jogada de um lugar para outro, sempre de mala na mão. Ou morando com um parente distante – em geral uma velha, de quem também cuidava.
Na vida paulistana, essa figura sumiu. Claro, muita mulher não se casa. Nem por isso vive o estereótipo da solteirona. Uma amiga minha teve vários relacionamentos. É uma linda mulher, mas chegou à faixa dos 40 sem se casar. Mora com os pais, a quem adora. Fez recentemente uma nova faculdade, tornou-se uma profissional respeitada. Há algum tempo, o fato de não ter se casado seria visto como um estigma. Hoje é até invejado por algumas amigas.
— Que sorte, você é independente!
Ela está muito feliz. E resolveu adotar uma criança.
— Vou ser vovô – contou o pai dela, feliz da vida.
Pois é. A antiga solteirona transformou-se em mulher independente.
Pode até cuidar dos pais, se a relação é boa. Mas não é vista como uma fracassada porque não arrumou marido.
Nem como um trambolho. Pelo contrário. Conheço uma senhora, médica, que por ser sozinha guarda a maior parte do que ganha, usa roupas de grife e é invejada pela irmã.
É ela quem ajuda a outra, em litígio com o ex-marido e com a vida profissional estacionada após um longo casamento. Essa figura tão comum na metrópole namorou, beijou, mas, como diz uma amiga, “não tem vocação para lavar cuecas”..
De fato, enquanto boa parte das casadas enfrenta a dupla jornada de trabalho, em casa e no emprego, as outras saem com as amigas, vão a shows e se dão ao luxo de deixar o apartamento desarrumado quando têm preguiça.
E a velhice? A maioria terá feito uma boa poupança, e poderá viver com conforto. Mesmo porque, hoje, lamentavelmente, filhos não são mais garantia de ter quem cuide da gente na velhice. Muitos pais idosos passam o tempo tentando arrumar a vida de filhos descabeçados.
A boa notícia é que essa nova mulher, sozinha mas não solitária, não está condenada a ser um estorvo para os parentes. Tem vida própria. Pode cuidar dos pais, mas por opção. E se dá ao luxo de namorar até pela Internet, sem viver eternamente buscando casamento por sentir a obrigação de ostentar uma aliança no dedo. A solteirona do passado viveu uma reciclagem.
Marido não é mais fundamental. Felicidade, sim. Graças a Deus!
Colaboração de Wilma Santiago